Do direito ao sumiço
Já tem algum tempo que apaguei o aplicativo do Facebook do meu celular. Isso, como um primeiro passo enquanto pensava se deveria era apagar minha conta do Facebook logo de uma vez. Mas não achei preciso. Tirar do celular já foi suficiente.
Isso porque me incomoda essa coisa de "estar conectado" o tempo todo. Eu a-do-ro passar tempos desconectada, longe de tudo, só perto de mim. Por isso sempre adorei escrever meus diários, fazer coisas sozinha, ter minhas coisas só minhas. O ano em que passei em Estocolmo, fiz questão de ficar fora do ar também. Já existia internet e tudo, mas eu fiz questão de não ler uma notícia do Brasil. Ligava de vez em quando para minha mãe (e tinha notícias do pessoal) escrevia de vez em quando para os amigos. E só. Que delícia foi aquele ano, "sumida" de tudo e todos. Aprendi tanto. Cresci tanto.
Continuo achando fundamental ter meus momentos assim. E por não ter filhos pequenos, ainda posso me dar o luxo de simplesmente "sumir" de propósito. Por isso, tem horas que desconecto telefone, ponho celular no silencioso, sumo, não conecto, não leio e-mail, não vejo, não respondo. Depois de umas horas ligo novamente a parafernalha e volto ao mundo dos conectados, feliz da vida. Por isso gostei tanto de uma coluna da Martha Medeiros, de outurbo de 2009, mas que continua atualíssima:
Do direito ao sumiço - Martha Medeiros
Em janeiro de 2008 publiquei uma crônica chamada "O Direito ao Sumiço", onde eu falava sobre pessoas que viajam, mas são incentivadas a mandar notícias a todo instante, seja por e-mail, MSN, Skype ou o que for. Uma ansiedade que não havia antes: quando alguém embarcava para longe, no máximo enviava uma carta, um cartão-postal, telefonava de vez em quando, mas ainda conseguia se sentir livre e sozinho, distante de todos e mais próximo de si mesmo. Hoje, com toda a parafernália tecnológica à disposição, você não consegue desaparecer: é facilmente acessado, esteja no continente que estiver. Vantagem para quem ficou e sente saudades, mas o viajante que não se desconecta perde uma rara oportunidade de levar a cabo a frase que tantas vezes é dita quando estamos sobrecarregados: "Que vontade de dar uma sumida".
Isso me veio à mente quando li as notícias sobre o estraho caso da France Telecom. No espaço de um ano e meio, 24 funcionários da empresa se suicidaram, sem contar os 13 que tentaram se matar e não obtiveram sucesso 0 acho que sucesso não é a palavra mais adequada pra situação, mas enfim. Eu não conheço os pormenores do assunto, mas me chamou a atenção o fato de a morte desses funcionários estar vinculada às condições de trabalho: todos sentiam-se demasiadamente pressionados. Até aí, não vejo justificativa para dar fim à vida, a pressão faz parte do meio corporativo em qualquer lugar do planeta, mas há um ponto que merece ponderação: a avalanche de mensagens que lotavam seus computadores e blackberrys foi relacionada ao profundo estresse que os acometia. Faz sentido. Algumas pessoas não conseguem mais distinguir o que é vida pessoal e o que é vida profissional. Estão permanentemente conectadas com os outros, a ponto de perder a conexão consigo próprias.
O blackberry e o iPhone, por exemplo, são infernais: sei de gente que acorda de madrugada para checar e-mails, numa atitude totalmente compulsiva e insana. As pessoas se sentem agoniadas quando ficam fora de alcance. É comom se o isolamento, o silêncio e a privacidade expatriassem a criatura, a impedissem de estar em meio aos acontecimentos. É uma inversão total de percepção: só nos sentimos vivos quando acionados pelos que estão de fora. Parece até que dentro de nós não acontece nada, não há nenhuma novidade a descobrir.
Óbvio que deve haver outros motivos para a onda de suicídios dos funcionários da France Telecom, mas esse vício de ficar conectado 24 horas, seja por mania ou por exigência profissional, merece uma reflexão. Não podemos perder nosso direito ao sumiço, de dar aquela escapada saudável, que pode acontecer tanto numa viagem como aqui, no dia a dia, bastando pra isso não acessar a internet, desligar o celular e curtir a tão necessária companhia de si mesmo. Do contrário, vão pipocar mais casos de gente que surta e acaba saltando da ponte como única alternativa de dar uma sumida.
As exigências da vida moderna - cansativas!!! Muito bom o texto.
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