Por uma televisão no quarto
Outro dia, escrevendo para uma amiga, lembrei de um episódio de infância que só agora, adulta, pude entender. Parece simples mas é profundo. O resumo da história é: quando eu era pequena, eu queria que a televisão fosse no meu quarto.
Explicando: lá em casa tinha uma tv no "quarto de televisão" (Aliás, bons os tempos em que usávamos as palavras em português mesmo. Não tinha nada de home ou suite master.) e uma no quarto dos meus pais. E eu lembro que, quando criança, mesmo sem ter tanto o hábito de assistir televisão, eu olhava aquela televisão em cima do móvel no quarto deles e queria tanto que ela estivesse no meu quarto.
Hoje, lembrando desse sentimento, entendi o que é que, de fato, eu queria.
Na verdade, era o seguinte: o quarto dos meus pais era um lugar muito seguro. Ali, todo mundo tinha todas as respostas. Tudo era mais calmo, mais tranquilo. Eu me sentia bem ali. Parecia que a cama deles era mais gostosa que a minha. Adormecer ali era mais gostoso que no meu quarto. As pessoas ali tinham todas as respostas, resolviam todos os problemas e sempre sabiam o que dizer pra que tudo ficasse bem. Era uma segurança bem diferente da que eu sentia em mim mesma, uma criança de uns 5, 6 anos de idade, com tanta coisa para aprender.
Por algum motivo, eu identifiquei que o que tinha de diferente entre o quarto dos meus pais e o meu era a televisão - e por isso queria que ela estivesse no meu quarto. Ou seja, na verdade, não tinha nada a ver com a televisão em si. Era a segurança deles, dos adultos, que eu desejava ter em mim.
E isso me faz pensar: quantas vezes a gente não projeta num objeto qualquer um desejo por, na verdade, estados de espírito? Quero esse sapato, essa bolsa, esse carro, essa roupa... Será que é a bolsa mesmo e o sapato mesmo que a gente quer?
E sim, tem vezes que é. Eu por exemplo, acabei de comprar uma mesa aqui pra casa, que coloquei num cantinho e transformei em escritório. Eu estava precisando dessa mesa, desejei tê-la, comprei e agora toda vez que olho pra ela ou a uso (como agora) fico feliz porque a mesa está cumprindo a função que eu queria. Mas... e as outras coisas? E aquele tanto de blusas que eu tenho? Aqueles vários sapatos? O que será que na verdade eu estava querendo, quando os comprei? Mais autoconfiança? Amor próprio? Atenção? Amor?
Acho que uma maneira simples de identificar se o que a gente queria era a coisa em si ou algo muito mais profundo é o nível de felicidade que o objeto nos traz depois que a gente compra, e por quanto tempo. Por exemplo, eu tenho um sobretudo lindo que um dia coloquei na cabeça que queria. Eu tinha visto numa revista americana, e por isso, não tinha como comprá-lo. Mas queria tanto que comprei o tecido e minha mãe levou uma costureira fazer. E ficou tão lindo. E até hoje (isso tem uns 7 anos) eu fico feliz quando olho o casaco. Porque sim, era o casaco que eu queria!
Mas e algumas outras coisas, compradas e não aproveitadas? Era óbvio que foram compradas tentando suprir uma carência por algo que não é vendido em loja.
Tenho a felicidade - e até o orgulho - de poder dizer que faço pouco esse tipo de compra. Costumo gastar meu dinheiro com comida, livros, cinema, revistas e okay, lingeries - que adoro comprar! Mas fico satisfeita comigo mesma de perceber que não sou tão vítima do consumismo desenfreado e vazio que se alastra por aí. Gosto de comprar coisas sim, mas geralmente para transformá-las em experiências. (uma batedeira, pra fazer meus quitutes e serví-los em jantares; um jogo, pra reunir os amigos em volta da mesa e ter horas de diversão etc) Qualquer outro dinheiro que eu tenha gasto de outra forma, acabou sendo para enriquecer os donos das lojas, e não a mim mesma.
Há de se prestar atenção, meninos e meninas. Há de se prestar atenção para descbrir o que é que você realmente está buscando, quando deseja fazer uma compra. Para aí finalmente poder ir atrás da coisa certa.
Porque mesmo que você consiga comprar tudo o que você quer, você nunca ficará feliz se aquelas coisas não forem as que, de fato, você estava precisando...
Mone,
ResponderExcluirAdorei este post. Eu sempre soube que sua relação com bens materiais era dessa forma e coincide muito com o que penso sobre isso. Sim, temos de ter essa clareza: "será que eu preciso disso mesmo?". Tem gente que usa a máxima: "eu mereço" para se endividar toda.Será? Enfim, muito madura essa sua reflexão. Beijos!!!