Dá menos trabalho

Nesta última 6a feira completou nove meses que marido e eu chegamos aqui nos states. Isso significa que tem os mesmo nove meses que eu não trabalho. (Tecnicamente tem 10, já que entrei de licença um mês antes de vir pra cá. Mas o processo de mudança foi tão corrido, que seria loucura contar aqueles dias como descanso.)



Vivo em contato com os amigos que ficaram - trabalhando e/ou estudando - no Brasil. E claro, vira e mexe alguém suspira e diz que daria tudo pra também ter essas longas férias como estou tendo. E é aí que eu entro dizendo: férias? Não, meus amigos. Eu não estou de férias. Na verdade, é bem o oposto disso.



Essa introdução não é pra dizer que cuidar da casa, cozinhar, lavar, passar, fazer mercado etc dá muito trabalho, blablabla, porque isso eu faço sorrindo e cantando. Essa introdução é pra chegar em dois pontos:



1. Só se tem férias quando se trabalha.


2. Quem não trabalha cansa muito mais.




Sobre o 1o ponto:


Eu já passei por todo tipo de fase na vida no que diz respeito à ter ocupações. Já tive fases insanas de tão corridas, nas quais eu não tinha quase nenhum tempo livre e vivia em cima de listas de monografias pra entregar, seminários pra apresentar, livros pra ler, provas e não sei mais o quê. Vivia acordando domingo às 6am pra dar conta de fazer tudo. Já trabalhei em empresa privada que queria meu sangue e mais um pouco. Já trabalhei em órgão público, onde trabalho tinha mas também horário pra chegar e ir embora, e não levávamos trabalho pra casa, e então a vida seguia tranquila. Já estudei e estagiei ao mesmo tempo. Já passei temporadas viajando, sem qualquer outro compromisso senão o de estar lá. Já passei períodos estudando pra concurso, maturando pra vestibular, ou dobrando a jornada de colégio pra conseguir entrar no Colégio Militar. Enfim. Já tinha passado pelas situações mais diversas, mas nunca pela qual estou passando agora: impedida de trabalhar porque apenas o visto do marido é de trabalho (o meu é o de "esposa"). E impedida de estudar por razões outras atreladas também ao visto. Mas o caso é esse: há 9 meses meu tempo tem sido todo meu, para fazer o que eu bem entender. Paraíso? Também, mas não somente.

A gente tende a pensar que não ter que fazer nada deve ser a melhor coisa do mundo porque acostumou a ter que trabalhar ou estudar e sabe o quanto é gostoso estar de férias. Mas o sentimento de "que delícia que é estar de férias" só existe quando aquilo, de fato, são suas férias. Querendo dizer: quando o tempo livre é delimitado (pode até ser longo, mas tem dia pra começar e terminar) e quando vem acompanhado pela consciência de dever cumprido, de um rumo na vida, de uma compensação merecida por tanto esforço. E nada disso vem de graça para mim no momento.

Essas coisas fazem muita falta. Quem nunca parou na vida pode até achar que não, mas eu posso afirmar com segurança que sim. O que nos leva ao segundo ponto:

Quando a falta dos sentimentos acima bate e a gente está impedida de trabalhar ou estudar, resta a nós mesmos correr atrás do prejuízo e nos motivar para utilizar o tempo de uma maneira produtiva, que conte e talvez até que nos renda algum resultado uma vez de volta ao mercado de trabalho. Ou seja: de repente a gente está atuando dos dois lados da questão. A gente não só tem que dar conta do recado, mas também tem que ir atrás do que dar conta.

Quando você trabalha, alguém faz uma das partes pra você. É só você chegar lá de manhã e provavelmente sua mesa vai estar cheia de problemas pra você resolver. Então o seu trabalho é só um: o de resolver. O meu, são dois: o de inventar os problemas, e o de resolvê-los. Acredite em mim quando eu digo: trabalhar dá muito menos trabalho. E o melhor: ainda te pagam! Como a cereja do topo, virão as férias, que serão muito mais gostosas.

Hoje de manhã eu já malhei, arrumei a casa e tomei um banho de banheira. Daqui a pouco eu vou deitar no sofá pra terminar de ler meu livro, e aí depois talvez eu veja um filminho água-com-açúcar. Ficou vontade de trocar de lugar? Não seja bobo. É claro que eu aproveito o tempo, a vida e tudo o que estiver ao meu alcance, porque esse é o meu modus operandi mesmo. Mas enquanto isso, ao mesmo tempo em que descanso, eu também estou trabalhando em dois livros, estudando piano, fazendo francês, ajudando em algumas traduções, fazendo o blog e revisando umas monografias na amizade. Porque produzir é preciso - e tão necessário quanto descansar.

Comentários

  1. Nossa Simone, que desabafo perfeito. Eu já vivo nessa "vida" há 30 anos, desde que casei e tive que parar de trabalhar, trabalhar fora, é verdade.
    Mas essa história de trabalhar em casa, é muito mais complicado. Pois no meu caso, sou eu quem resolve praticamente tudo, levar carro pra oficina, supermercado, providenciar consertos em casa, fazer comida, arrumaçao, lavaçao e um monte de outros "ção". Eu sempre falo, que só nao faço ganhar o dinheiro, mas o resto sou eu que faço e no final o trabalho nao rende, nao é reconhecido e nao nos traz remuneraçao. Mas a compensaçao é quando encontramos o suporte em um marido que nos dá o devido valor!!!!!
    E tem 2 anos que estou recebendo salário fixo(nao gosto de falar mesada)....e minhas férias sao curtidas sozinha em Goiania...rsrsrsrsrsrsrs

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  2. Oi, Tina! É verdade! Essa coisa de trabalhar em casa é complicado mesmo. Até porque, estando nessa situação, a gente sempre passa os fins de semana e feriados no local de trabalho, risos! E com isso, é fácil não parar nunca! E casa é fogo mesmo. Sempre tem alguma coisa pra fazer, resolver, consertar, limpar, etc etc. Por isso, é importante mesmo que o marido e os filhos reconheçam o valor desse trabalho, que não é pouco. E muito interessante a ideia do salário fixo. E principalmente, das férias em outra cidade - que só assim devem ser férias mesmo!! Beijos!

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