No meio é melhor



Um dos livros mais interessantes que li ano passado chama-se The secret power of middle children - how middleborns can harness their unexpected and remarkable abilities (tradução livre: o poder secreto dos filhos do meio - como os filhos do meio podem tirar proveito de suas qualidades inesperadas e impressionantes). O título sozinho já é a própria sinopse. E eu resolvi ler, não por ser uma filha do meio (tenho somente uma irmã, mais velha) mas por ser casada com um e ter sido criada por outro. E por isso foi uma leitura interessantíssima.



A obra nasceu de uma tese de doutorado da autora, Catherine Salmon, então os dados são todos científicos. E o mais legal é que para falar dos filhos do meio, ela acaba falando de todas as outras ordens de nascimento, incluindo os filhos únicos. A única classe que ela infelizmente não aborda (teria sido interessante ler) é a dos filhos gêmeos, talvez por ser específico demais. Mas das outras posições de nascimento a gente encontra bastante informação. Então, na medida em que fui lendo, fui lembrando das pessoas que conheço e vendo como aquelas coisas fazem sentido - e como a ordem do nascimento influencia a personalidade, e por consequência, a vida das pessoas.


Sobre os filhos do meio, a autora mostra que, ao contrário do que pensa o senso comum, de pobre coitados eles não tem nada. É verdade sim que os filhos do meio são os que tendem a receber menos atenção individualizada dos pais, mas isso acaba sendo muitíssimo saudável. Por conta de crescerem sem tanta atenção e passarem seus primeiros anos de vida tendo sempre que esperar necessidades mais "urgentes" dos filhos mais velhos e mais novos serem atendidas pelos pais (um ainda precisa trocar a fralda! o outro já tem horário de escola!), os filhos do meio crescem pessoas bem resolvidas, independentes e seguras de si. Como já entenderam que nada na vida vai cair do céu, são batalhadores e cheios de atitude. Por não terem tanta atenção dos pais os sufocando (caso dos mais velhos) nem por recebrem mimos demais (caso dos mais novos), os filhos do meio se sentem livres para buscar na vida aquilo que realmente querem fazer, o que os torna na maioria dos casos profissionais bem sucedidos que trabalham com aquilo que amam. Por não terem também a ligação super-estreita dos mais velhos com os pais e por não se sentirem os únicos responsáveis pelos pais (caso dos únicos), eles se sentem livres para seguir seus sonhos, mesmo que para isso precisem morar longe de casa e da família. Ao mesmo tempo, por terem crescido necessariamente entre, no mínimo, dois irmãos, são pessoas sociáveis e que valorizam bastante a família. O livro é riquíssimo e eu poderia escrever páginas e páginas sobre o assunto, mas para resumir, aqui vão outras qualidades dos filhos do meio: são pessoas justas, equilibradas, ponderadas, corajosas, inovadoras e confiantes.


Segundo as pesquisas, a ordem de nascimento que provoca mais problemas para quem nela nasce é a dos mais velhos, que tendem a ser eternos dependentes da aprovação dos pais, e custam muito para "cortar o cordão". Os mais velhos tendem a ser autoritários e a ter dificuldade para trabalhar em grupo - o que pode dificultar casamentos, amizades e outros tipos de alianças. Por conta da inexperiência dos pais, os mais velhos tendem a ser inseguros e talvez um pouco amedrontados, e apesar de serem bastante favorecidos em comparação aos outros irmãos, tendem a se julgar injustiçados, já que poucos são os que superam o trauma de ter sido "destronado". Já os mais novos compartilham de várias características dos filhos do meio (yes!) mas podem vir a ser rebeldes sem causa e podem ficar mal acostumados com certos paparicos e exceções que lhes são abertas. Também podem hesitar alçar maiores vôos caso não tenham antes uma rede de proteção tomando conta, mesmo que de longe. Mas tendem a realizar feitos diferentes e inusitados já que sabem que para conseguir a atenção dos pais (que já observaram todos os outros irmãos passarem por suas fases) o trivial não basta. Então fazem parte dessa classe [bem como os filhos do meio "mais novos" (os de grandes famílias, com 4 ou mais filhos)] inúmeros inventores e pessoas que mudaram a cara do mundo. Dos filhos únicos ela fala um pouco menos, e uma das coisas mais marcantes é que eles tendem a carregar o peso do mundo nos ombros, já que fica para eles, sozinhos, a "tarefa" de agradar aos pais. Mas por conta de não precisarem disputar território com outros irmãos costumam se tornar pessoas com boa auto-estima, criativas e autênticas (já que crescem vítimas de menos comparações).


É claro que existem casos e casos, e aí a autora fala dos casos típicos, onde o intervalo entre as idades é pouco e o sexo dos irmãos é o mesmo, e das variações inúmeras. Mas no fim chega-se nisso: a ordem em que a gente nasce molda parte de nossa personalidade e pode influenciar bastante. A ordem de nascimento que leva mais vantagens (não com relação aos pais, mas às qualidades que desenvolverão e por consequência, como vão lidar com a vida) é a dos filhos do meio. E infelizmente, num mundo pra lá de populoso, em crise e com famílias cada vez menores, é justamente a classe que tende a entrar em extinção.

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